segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009



Consciência humana: ação e incerteza

Navegar é preciso, viver não é preciso. Mais que a relevância de um lema que fomenta o destino de um povo, de uma nação em busca de identidade e novas riquezas, como o foi Portugal, é a capacidade agir diante das incertezas entre o mundo real e o imaginário. Ou seja, as ações embasadas em viagens reais sobre o mar desconhecido, corajosas e polêmicas que foram o ponto de partida para a modernidade e uma nova relação com os elementos da natureza e novas formas de discurso e domínio. E nova relação humana de saber e consumo, através do advento das novas tecnologias.
A empresa lusitana só foi possível após apartar-se do medo apocalíptico do fim do mundo propagado culturalmente em toda a Idade Média por conta da Igreja, única detentora de um saber aprofundado. Com o Renascimento o homem foi elevado ao pico das preocupações humanas e consequentemente passou a se relacionar mais criticamente com a natureza e transformá-la para seu conforto e para seu pleno desenvolvimento.
Do atraso cultural no período da concepção teocrática (Deus como centro das intenções, como o foi na Idade Média) ao rompimento do lacre da modernidade o homem passou a ser agente transformador do objeto que o viabiliza a sobreviver e demarcar relações de poder. Sem essa relação não seria possível a convivência num mundo em que tudo o que se transforma está relacionado à adaptação ao mundo imprevisto, ao convívio com o novo, com o abstrato.
No que diz respeito às viagens portuguesas poderemos confrontá-las com as viagens espaciais atuais. O fascínio que temos pelo espaço passa pela polêmica de saber o quanto pagaremos pela ousadia de ultrapassar os limites do imaginário. Na época lusa, Camões em Os lusíadas, na voz da personagem Velho do Restelo, fez um alerta à expansão portuguesa quando esta saiu pelo mar desconhecido deixando órfão o povo miserável material e culturalmente. O mesmo discurso encontramos hoje na empresa espacial em que se gastam vultosas fortunas, sendo que em nosso planeta, inúmeros povos encontram-se em condições de vida desumanas e em absoluta miséria. Mas por outro lado, pode ser um caminho para a compreensão humana. Heróis à parte, pessoas e nações em risco não representam a necessidade de um conglomerado de nações interligadas pela globalização e pela aproximação dos costumes, das culturas, da culinária e dos desejos de consumo. Mais que isso, representamos uma fonte de experiência para as gerações futuras no momento em que somos parte de um discurso ideológico e de uma cultura compromissada com o anseio de formar uma comunidade terrígena desbravadora de novos mundos, de novos espaços e, sobretudo de novas tecnologias a serem aplicadas a uma velocidade geradora de desenvolvimento, compreensão humana, ao mesmo tempo excludente no que tange ao estágio cultural em que se encontram os povos; uns ainda tão impregnados em seus conceitos mais fundamentais e religiosos; e outros tão impregnados ao consumismo nada se importam em conviver com os demais de sua raça e de sua cultura.
Em suma, o que as ações portuguesas, vislumbramento para o novo mundo, o éden prometido na Bíblia (o desenvolvimento humano via novas descobertas tecnológicas) fizeram foi possibilitar ao homem a apropriação de meios transformadores da natureza em benefícios. Assim como as observações do Velho do Restelo, essas apropriações das revoluções tecnológicas incondicionalmente promoveram um discurso voltado para o consumo dos produtos tecnológicos, essenciais para a vida humana e até certo ponto excludente para a maioria que não tem acesso a esses benefícios, pois só seriam amplamente benéficos se a população fosse mais homogênea material e culturalmente.

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